
A demanda por soluções de Inteligência Artificial (IA) exige profissionais qualificados para lidar com as profundas transformações que essas novas tecnologias têm provocado nos mais diversos setores mundo afora. De olho nessa crescente necessidade, o Instituto Metrópole Digital (IMD/UFRN) implantou no ano passado o programa Metrópole IA 360, com formação em variados níveis de ensino voltada à área, com a projeção de capacitar, ao menos, 70 mil pessoas até 2028. Um dos resultados do programa é a criação do primeiro curso de graduação em IA do Nordeste e do primeiro curso técnico da área em uma instituição pública no Brasil.
O curso de Bacharelado em Inteligência Artificial (BIA) formou sua primeira turma no primeiro semestre deste ano, com 40 vagas, com uma formação associada ao Bacharelado em Tecnologia da Informação (BTI). A professora Ismenia Blavatsky, diretora de Ensino do IMD e coordenadora do BIA, explica que a formação em IA, no caso da graduação, é feita em ciclos. Após o primeiro, que contempla a formação em BTI, com conteúdos como matemática, lógica e computação, o aluno poderá optar, no ciclo seguinte, pelos conteúdos direcionados à Inteligência Artificial em áreas como jogos, ciência de dados, empreendedorismo e inovação, redes, internet das coisas, dentre outros.
O ingresso no BTI ocorre por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Após isso, a seleção é feita por meio de critérios estabelecidos em edital – um deles prevê que, quanto mais o aluno cursou disciplinas relacionadas à Inteligência Artificial no BTI, maiores as chances de ingresso no BIA. “O aluno vai encontrar, ainda, conteúdos como IA generativa, modelos de aprendizado de máquina e estruturação de ferramentas. Dependendo de como foi a formação do estudante no BTI, em mais um ano e meio, ele consegue concluir a graduação em Inteligência Artificial”, afirma Ismenia.
Segundo a professora, 36 das 40 vagas ofertadas no início do ano estão preenchidas. As outras quatro estão em aberto porque os estudantes receberam boas propostas de trabalho e decidiram suspender os vínculos com o curso para se dedicar a novas oportunidades. Tales Alves, de 27 anos, está entre os mais de 30 alunos que estão cursando a graduação em Inteligência Artificial na UFRN. Ele conta que as boas oportunidades no mercado de trabalho para quem domina as ferramentas de IA chamaram a atenção e serviram de atrativo na hora de optar por uma área após a formação em TI.
“Desde 2023 que eu estudo um pouco sobre IA, por causa do boom do ChatGPT. O futuro está nas mãos dos engenheiros de dados e isso está cada vez mais claro para as empresas”, fala. Tales conta que a experiência tem valido muito a pena. “O curso é excelente. As coisas que eu acompanho em sala de aula consigo aplicar muito bem no meu estágio profissional e na bolsa da qual participo”, afirma o estudante.
A coordenadora do BIA diz que o mercado para os profissionais formados em Inteligência Artificial é amplo – vai desde a otimização de processos, passando pela construção de modelos para otimização de ferramentas, até a aplicação em áreas de processos repetitivos, tomada de decisões baseadas em dados, vendas ou educação. “Todas as áreas podem ser beneficiadas, porque comportam a necessidade de profissionais com formação em IA”, aponta Ismenia.


Edital terá 40 mil vagas para professores
O professor José Ivonildo Rego, diretor-geral do IMD, afirma que o Metrópole IA 360 foi criado para gerar uma sinergia entre educação, inovação e a sociedade com vistas à área de Inteligência Artificial. “A melhor forma de criar essa energia, tendo em vista as muitas oportunidades, é a formação em larga escala. E o programa foi pensado justamente tendo como ponto de partida essa ideia. Por isso, estamos oferecendo capacitação em diferentes níveis, com diferentes linhas de atuação”, frisa.
Além do bacharelado, o programa Metrópole IA 360 oferta o curso técnico em Inteligência Artificial, que tem duração de dois anos. O ingresso é feito por meio de seleção via edital. São ofertados quatro módulos a cada semestre, com certificações entregues aos estudantes ao final de cada seis meses. Mas o aluno só recebe a certificação de formação técnica ao fim do quarto módulo, que é uma espécie de estágio. O curso tem carga horária de mil horas e oferta 1,2 mil vagas anuais.
Duas outras linhas são o Conecta IA e o Nano IA. O primeiro é um curso voltado a alunos de qualquer graduação da UFRN e também de egressos da instituição, que oferece certificação para quem cumprir uma carga de 300 horas em capacitação em áreas ligadas à Inteligência Artificial, como ciência de dados, internet das coisas, bioinformática, informática internacional e outras. Para o público interno, o Conecta oferece 200 vagas anualmente, sendo que o aluno que optar pela formação precisa apenas fazer a adesão na própria grade de ensino.
Para o público externo, são 30 vagas por ano e, nesse caso, é feita uma seleção. O Nano IA, por sua vez, é um curso de duração mais curta, de cerca de 40 horas, voltado a demandas específicas de empresas. “Estamos nos preparando para oferecê-lo ao Sebrae-RN, onde iremos treinar uma equipe de cerca de 400 colaboradores”, explicou Ivonildo Rego. Para o dia 8 de setembro está previsto o lançamento, dentro do Nano IA, de um edital pela UFRN em parceria com a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), para um curso on-line de curta duração de 45 horas voltado a professores da Educação Básica, com o objetivo de ampliar o acesso ao tema em escolas públicas e contribuir para a inclusão digital. As vagas serão destinadas a professores de todo o País. “A ideia é que eles aprendam a usar tecnologias como o ChatGPT. Ainda não há previsão de quando as aulas vão ocorrer, mas as inscrições deverão ser feitas entre outubro e novembro”, pontua o diretor-geral do IMD.
Além disso, o Metrópole IA 360 prepara uma pós-graduação lato sensu com duração de 18 meses, onde será ofertada residência, com bolsas de R\$ 3 mil. “A residência será feita em parceria com empresas e setores como o Judiciário, que já oferecem bolsas para outras áreas. O início dessa residência, portanto, depende dessas parcerias”, afirmou Ivonildo Rego. No programa também está incluso o Núcleo de Inteligência Artificial e Ciência de Dados, que terá laboratórios e áreas destinadas a projetos de Pesquisa, Desenvolvimento & Inovação. As obras já foram finalizadas e o Núcleo aguarda agora a aquisição de equipamentos. Não há previsão de início de funcionamento.

Mercado busca profissionais qualificados
A formação de profissionais ligados à Inteligência Artificial é uma necessidade gritante nos dias atuais. A alta demanda por trabalhadores, puxada pelas mudanças que a IA tem provocado nas empresas, evidencia que os impactos da formação em larga escala serão positivos.
Daniel Luz, CEO da beAnalytic, startup que desenvolve soluções em Inteligência Artificial para outras empresas, avalia que, diante da escassez desses profissionais no mercado, é preciso que instituições de ensino atentem para o fato de que é preciso fazer frente a formações para a área.
“A Inteligência Artificial é a nova revolução industrial. Daqui para a frente, todas as empresas vão usá-la de alguma forma. Então, a demanda por esse tipo de profissional já é muito grande”, avalia. Além disso, Luz avalia que os bons salários servirão como um novo atrativo para a expansão da área.
“Hoje, um profissional iniciante entra no mercado ganhando na faixa dos R$ 5 mil. Depois disso, a depender do nível de formação, o céu é o limite, com salários de até R\$ 50 mil”, afirma Daniel Luz, o CEO da beAnalytic.
Ele conta que a beAnalytic, graduada no início do ano pela incubadora do Parque Metrópole, do IMD, já desenvolveu soluções com IA para empresas como Telefônica e Mapfre. Atualmente, a startup trabalha em um modelo de IA para uma grande rede nacional de farmácias.
“A solução envolve sugestão de vendas de medicamentos por meio de um site”, relata. A empresa conta atualmente com 30 funcionários, dos quais, a maioria possui formação em outras áreas. “Grande parte do nosso time ainda é formada por profissionais de áreas que acabaram migrando para a de ciência de dados, por isso a formação em Inteligência Artificial é muito importante. Hoje, quando a gente procura profissionais de nível pleno, costuma haver um processo bem complexo até encontrá-los”, pontua Daniel Luz.
Ismenia Blavatsky, diretora de Ensino do IMD e coordenadora do BIA, cita que a formação deve ser um ponto de atenção para diversas áreas e que investir nessa área poderá ser um diferencial no futuro.
“Um bom profissional da educação, por exemplo, poderá otimizar processos com Inteligência Artificial e de forma mais efetiva trazer esses conteúdos para os estudantes. Pessoas que lidam com tomadas de decisão podem utilizar as ferramentas para trazer mais segurança a produtos e processos na indústria, comércio e serviços. Então, investir nesse tipo de conhecimento será um diferencial para encarar os desafios futuros que a gente nem tem ideia de quais são exatamente”, aponta Ismenia Blavatsky.