FUTURO DESCOMISSIONAMENTO EÓLICO É PROMISSOR NA INDÚSTRIA NO RN

Esta é a terceira e última reportagem da série Ciclo dos Ventos, que discute o futuro do setor diante do descomissionamento dos parques eólicos. Aqui, exploramos os cenários, exemplos internacionais e o potencial do RN para liderar essa nova cadeia de inovação. Confira também:
Parte I: RN se prepara para descomissionamento de primeiros parques eólicos
Parte II: Fim de vida útil de parques eólicos abre portas para novos negócios

A experiência acumulada nos últimos 20 anos permitirá ao setor adotar tecnologias mais inteligentes e práticas inovadoras, transformando a desmontagem em um processo estratégico e ambientalmente responsável. Elbia Gannoum, presidente executiva da ABEEólica, acrescenta que as ações de hoje terão papel crucial para o segmento no futuro, quando os parques atuais precisarão passar por atualizações. “O descomissionamento não é apenas o fim de um ciclo, mas o início de um novo capítulo de inovação para a energia eólica no Brasil. As soluções que estamos estudando hoje vão definir como o setor vai operar nos próximos 30 anos”.

O Brasil conta atualmente com 1.147 parques eólicos em operação, distribuídos principalmente pelos estados do Rio Grande do Norte, Ceará, Bahia, Piauí, Paraíba, Pernambuco, Maranhão, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Juntos, esses parques somam 12.038 aerogeradores e uma capacidade instalada de 35,3 gigawatts. O Nordeste segue como a região mais protagonista, respondendo por 93% de toda geração eólica nacional. Há ainda 504 empreendimentos autorizados a construir ou já em construção. Todos os dados são da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Presidente executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), Elbia Gannoum – Foto: Alex Régis

Além disso, afirma Rodrigo Mello, diretor do Senai-RN, o setor acompanha atentamente experiências internacionais. Países como Alemanha, Dinamarca e Estados Unidos já implementam descomissionamento de turbinas antigas, integrando setores de reciclagem e construção civil. A adaptação dessas práticas ao contexto brasileiro poderá aumentar a competitividade e estabelecer o RN como referência global em gestão de parques eólicos e economia circular.

“Na Dinamarca já existe parque, na Alemanha já existe parque, na China já existe parque com essa experiência de descomissionamento. Nós estamos agora, inclusive, estou acompanhando o presidente da Fiern, Roberto Serquiz, numa missão na China, agora no mês de outubro e uma das coisas que eu pretendo ver lá são os equipamentos de descomissionamento para trazer tecnologia para cá, para a empresa local”, diz Mello.

Para Roberto Serquiz, presidente do Sistema Fiern, o descomissionamento é uma porta de entrada para novos negócios e inovação industrial. Ele destaca que o estado deverá ganhar infraestrutura capaz de absorver todo o material dos parques desativados, como uma futura siderúrgica, e que o momento é ideal para promover o RN como referência nacional na transformação de resíduos em novos produtos. “A partir do momento que você tem uma indústria que pode absorver todo o material advindo do desmonte desses parques, isso poderá se transformar num grande exemplo nacional. O social, o ambiental e o econômico vão se conectar”, diz.

Indústria da reciclagem terá papel crucial no descomissionamento – Foto: Magnus Nascimento/TN

O descomissionamento será mais do que um processo pontual de desmontagem; ele se apresenta como uma oportunidade de inovação e que fará parte definitivamente da indústria potiguar, analisa Sérgio Azevedo, presidente do Coere. Ele afirma que o RN pode transformar a retirada de aerogeradores antigos em um mercado contínuo e estruturado. “Não será um boom isolado. Teremos ondas sucessivas de descomissionamento: primeiro os parques da 1ª geração, depois os demais, além do futuro offshore”, afirma.

Do ponto de vista de demanda por profissionais no futuro, o Senai-RN já se prepara para esse cenário. Rodrigo Mello, diretor regional, explica que os profissionais formados na instituição, que atuaram na construção dos parques, poderão atuar diretamente nesse novo segmento, aplicando as competências em elétrica, mecânica e manutenção de equipamentos. “Não se trata de criar um profissional específico para descomissionamento, mas de reaproveitar a expertise já existente para gerar valor e novas oportunidades”, observa.

Dados da ABEEólica apontam que, em 2024, a energia eólica gerou 107,6 TWh, um crescimento de 12,2% em relação ao ano anterior. Essa geração poderia abastecer o consumo de Minas Gerais e Rio de Janeiro em 2023, beneficiando cerca de 36 milhões de habitantes. A energia eólica contribuiu com 16,7% de toda a geração injetada no Sistema Interligado Nacional (SIN) no período.

Offshore eleva expectativas

O futuro da energia eólica no Brasil é promissor, com destaque para a expansão de projetos offshore (no mar), a introdução de turbinas mais eficientes e o uso da energia eólica na produção de hidrogênio verde. Um estudo do World Bank Group mostrou que o Brasil tem um potencial técnico para a energia eólica offshore superior a 1.200 GW, e o desenvolvimento dessa fonte até 2050 dependerá de qual cenário o país escolher seguir. O relatório detalha três caminhos possíveis, cada um com impactos distintos na economia e na matriz energética nacional.

  • Cenário conservador: é o cenário mais modesto, projetando uma capacidade instalada de 16 GW de energia eólica offshore até 2050, o que representaria 3% da geração total do País. Para isso, seriam instaladas aproximadamente 1.100 turbinas, com um investimento total de US$ 40 bilhões até 2050.
  • Cenário intermediário: expansão moderada, com a offshore começando a ter um papel mais significativo na matriz elétrica brasileira, alcançando 32 GW de capacidade instalada até 2050. Isso corresponderia a 6% da capacidade total de geração do País. Para isso, seriam necessárias 2.100 turbinas e um investimento de US$ 80 bilhões. A implantação de 1,8 GW de projetos por ano justificaria investimentos em infraestrutura como portos e rede de transmissão, que seriam distribuídos de forma mais uniforme.
  • Cenário ambicioso: projeta a energia eólica offshore como um elemento crucial para a matriz elétrica, com 96 GW de capacidade instalada até 2050, representando quase 20% da geração total. Esse nível de expansão exigiria um investimento de US$ 240 bilhões e a instalação de 5,3 GW por ano. Além de colocar o Brasil como uma liderança global no setor, esse cenário é projetado para suprir a demanda de energia renovável necessária para a produção de hidrogênio verde (H2V), uma das grandes ambições do País. A realização desse cenário ambicioso levaria a um valor agregado bruto acumulado de US$ 168 bilhões e à criação de 516 mil empregos locais por ano.