FALHAS NA ATENÇÃO BÁSICA PROVOVAM ALTA NA MORTALIDADE INFANTIL NO RN

O secretário Alexandre Motta reconhece a gravidade da situação. Foto: Eduardo Maia

A taxa de mortalidade infantil no Rio Grande do Norte ultrapassou a meta estabelecida em 2024 e atingiu 15 óbitos para cada mil nascidos vivos, superando o limite de 12,12 definido para o indicador. Os dados são da Secretaria Estadual de Saúde (Sesap) em relatório de prestação de contas enviado à Assembleia Legislativa.

O secretário Alexandre Motta reconhece a gravidade da situação e atribui a alta mortalidade infantil à fragilidade da atenção básica prestada pelas prefeituras.

“A saúde das crianças abaixo de um ano envolve uma atenção permanente da puericultura e dos primeiros atendimentos no primeiro ano, que é feito pela rede básica”, afirmou Motta, em exposição na Comissão de Finanças da Assembleia nesta semana. Ele destacou que cabe à Sesap apenas coordenar e apoiar a rede municipal, com treinamentos e programas de qualificação.

Uma das iniciativas mencionadas foi o projeto “Cuidar em Redes”, que visa reorganizar a assistência nas unidades básicas de saúde. “Isso já existe, ocorre, está em funcionamento, mas os efeitos disso não são de forma imediata”, disse.

Outro dado alarmante apresentado por Alexandre Motta foi o da mortalidade prematura, que se refere a mortes entre 30 e 69 anos por doenças crônicas não transmissíveis (câncer, diabetes, doenças cardiovasculares e respiratórias). Em 2024, o índice chegou a 354 por 100 mil habitantes, o maior da série histórica. O secretário, porém, relativizou o aumento, atribuindo-o à queda da população do Estado registrada pelo IBGE: “Você mantém o número de doentes, mas mesmo assim diminui o número proporcional de habitantes.”

Ainda segundo ele, doenças como diabetes e hipertensão têm forte influência de fatores culturais e sociais, e o papel da Sesap é limitado à capacitação da rede. “O cuidado para que as pessoas melhorem suas taxas de controle da sua diabetes é da atenção básica”, afirmou.

No caso do câncer, ele mencionou que hábitos alimentares e o uso de agrotóxicos impactam negativamente nos indicadores. Já no caso das doenças respiratórias, citou a popularização dos cigarros eletrônicos entre os jovens como fator emergente de preocupação.

Outro dado de destaque foi o de óbitos maternos, que embora tenha diminuído de 66 em 2021 para 25 em 2024, apresentou crescimento em relação ao ano anterior. Motta classificou como inadmissível que mulheres ainda morram durante a gestação. “Para uma mulher morrer significa dizer que ela entrou numa circunstância onde a rede não conseguiu absorvê-la”, lamentou. Como estratégia, mencionou a atuação da Rede Cegonha, a criação do Hospital da Mulher em Mossoró, e a existência de comitês de óbito para investigação de falhas na assistência.

Ainda na audiência, o secretário demonstrou preocupação com a proporção de partos cesáreos — considerada alta — e com o percentual de gravidez na adolescência, que caiu de 15,4% para 11,3% entre 2019 e 2024, mas segue elevada. “Uma criança que engravida, ela não é capaz de ser mãe de outra criança”, afirmou. Ele atribuiu parte do problema a fatores culturais e religiosos que dificultam o acesso das adolescentes à educação sexual.

Apesar dos números desfavoráveis em alguns indicadores, Alexandre Motta apresentou avanços na rede estadual de saúde. O número de leitos hospitalares aumentou de 1.980 em 2019 para 2.187 em 2024, com destaque para a ampliação de leitos de UTI adulto, que mais que dobraram: de 109 para 223. Também foram criados 60 leitos de estabilização e 168 leitos em prontos-socorros.

Segundo o secretário, a ampliação dos serviços gerou um impacto direto nos custos. O gasto total com saúde no estado saltou de R$ 1,5 bilhão em 2019 para R$ 3 bilhões em 2024, o que representa um crescimento de 100% no período. “Nós tratamos a rede Sesap de hospitais. […] Esse dado numérico é de paciente que foi internado, paciente que entrou na nossa rede”, explicou ao comentar o crescimento dos custos com medicamentos.

O valor anual gasto com medicamentos passou de R$ 64 milhões em 2019 para R$ 127 milhões em 2024, com alta de 41% apenas no último ano. Ainda assim, o secretário reconheceu dificuldades no abastecimento da rede. “Faltam medicamentos, mas isso decorre da crise financeira que vivemos hoje”, disse.

Na audiência, também foi apresentado o aumento das despesas com pessoal. A folha de pagamento da Sesap subiu de R$ 828 milhões para R$ 1,174 bilhão entre 2019 e 2024. O número de servidores passou de 15.508 para 16.836 no mesmo período. Alexandre Motta explicou que, durante a pandemia, houve um aumento expressivo de contratos temporários, o que elevou os custos, mas que esse cenário vem sendo revertido gradualmente. “A nossa expectativa é que a gente tenha o mínimo possível [de temporários], chegando a zerar com a efetivação do concurso recente.”

Os custos com assistência hospitalar também cresceram de forma significativa, saindo de R$ 640 milhões em 2019 para R$ 1,464 bilhão em 2024. Já os gastos com insumos terapêuticos e profiláticos — como medicamentos, próteses e órteses — mais que dobraram, subindo de R$ 53 milhões para R$ 101 milhões.

Apesar do avanço orçamentário, o secretário enfatizou que não há saúde de qualidade sem mais recursos. Ele chegou a fazer uma estimativa: um acréscimo de 2 pontos na alíquota de ICMS poderia gerar R$ 80 milhões adicionais, dos quais 12% seriam obrigatoriamente investidos em saúde. “Só isso aí já ajudaria a gente em muito”, afirmou.

A audiência marcou o retorno da prestação de contas quadrimestral à Assembleia Legislativa, após um hiato desde 2019. Ao final, o secretário se comprometeu a manter a regularidade das apresentações e voltou a pedir articulação entre Estado e municípios para melhorar os indicadores. “Os problemas são conjuntos, e as soluções têm que ser buscadas conjuntamente”, concluiu.

Agora RN