
Entre rochas milenares, rios subterrâneos e histórias escondidas sob o solo potiguar, o Rio Grande do Norte acaba de abrir caminho para um novo capítulo do turismo estadual. A criação da Rota das Cavernas e Grutas, instituída pela Lei nº 12.482, transforma as formações geológicas do interior em protagonistas de um roteiro que une natureza, cultura e ciência. A iniciativa propõe um circuito turístico integrado com foco na sustentabilidade, na economia solidária e na valorização das comunidades locais, revelando ao visitante um RN que vai muito além do sol e mar.
De acordo com a secretária de Estado do Turismo, Marina Marinho, o projeto nasce embasado em estudos técnicos e em parcerias com órgãos ambientais e instituições de pesquisa. “A Secretaria de Turismo do Rio Grande do Norte já vinha acompanhando estudos e mapeamentos realizados em parceria com o Idema e o ICMBio sobre o patrimônio espeleológico potiguar. Esse levantamento inclui municípios como Felipe Guerra, Apodi, Baraúna, Martins, Mossoró, entre outros, que concentram formações geológicas de grande relevância e compõem o eixo inicial”, afirma.
Segundo o Governo, está sendo estruturado um grupo técnico multidisciplinar responsável pela regulamentação da iniciativa. O grupo, formado em parceria entre a Setur, a Emprotur e outros órgãos das esferas municipal, estadual e federal, é encarregado de definir as diretrizes de execução da rota e de elaborar o plano de regulamentação, cuja apresentação está prevista para o primeiro semestre de 2026.
O texto da lei, de autoria da deputada estadual Divaneide Basílio (PT), define que poderão integrar a rota os municípios com cavidades naturais subterrâneas de interesse turístico, histórico, cultural e ambiental, desde que com planos de manejo espeleológico e condições de visitação. A Setur-RN explica que o modelo proposto busca envolver as populações locais desde o planejamento até a operação das atividades turísticas.
“A ideia é captar recursos e cooperações técnicas para investimentos em infraestrutura, sinalização turística e qualificação profissional, que são bem específicas para esse tipo de turismo. Também estamos abertos a iniciativas da iniciativa privada que estejam alinhadas aos princípios de sustentabilidade e valorização do patrimônio natural”, disse Marina, secretária de Turismo do RN.
O turismo de natureza, aventura e espeleológico tem sido apontado como uma das principais tendências do setor em nível global. No caso do Rio Grande do Norte, a proposta se insere na estratégia de diversificação da atividade turística, tradicionalmente concentrada no litoral. “Essa nova rota amplia o olhar sobre o interior do estado, valoriza o nosso patrimônio geológico e natural, e contribui para um turismo mais sustentável, descentralizado e conectado com as comunidades locais”, destaca a titular da Setur.
Para o diretor-presidente da Empresa Potiguar de Promoção Turística (Emprotur), Raoni Fernandes, a Rota das Cavernas e Grutas é uma aposta estratégica para qualificar e ampliar a oferta turística potiguar. “A nova rota se alinha à política de diversificação de produtos que temos trabalhado, equilibrando a já consolidada oferta de sol e mar com experiências ligadas ao turismo de natureza, aventura e contemplação”, explica.
De acordo com Raoni Fernandes, a Emprotur pretende estruturar a promoção da rota com base em uma segmentação de mercado e na análise do perfil dos visitantes. A estratégia considera o público interessado em geoturismo, espeleoturismo e turismo de aventura, que apresenta características e motivações específicas, além de um alto potencial de gasto médio. O trabalho de divulgação será com foco na autenticidade, na conservação ambiental e na experiência sensorial dos viajantes.
O dirigente destaca que o RN tem um diferencial competitivo pela combinação entre patrimônio geológico, paisagem semiárida e acessibilidade. Segundo ele, a Rota das Cavernas se insere em um contexto territorial compacto, o que permite ao visitante vivenciar experiências diversas em poucos dias. Além do trabalho institucional, a Emprotur planeja incorporar a nova rota ao ecossistema digital de promoção do estado. A iniciativa deve ser incluída na plataforma “Visite Rio Grande do Norte”, com mapas interativos, vídeos imersivos e roteiros digitais.
Empresários enxergam oportunidades de negócio
A criação da Rota das Cavernas e Grutas é vista pelo setor empresarial como um avanço na interiorização do turismo e na oferta de novos produtos turísticos no estado. O presidente da Câmara Empresarial do Turismo da Fecomércio RN, George Costa, considera que iniciativas voltadas à diversificação são essenciais para atrair novos públicos. “Os produtos atingem clientes diferentes. Um cliente que já tenha vindo à parte litorânea do Estado e queira fazer um combinado com algo diferente passa a ter opção. Ou aquele cliente que não viria porque a atração dele não é praia, ele passa a ter uma atração”, observou.
Entre os atrativos que devem integrar a Rota das Cavernas e Grutas, o Parque Nacional da Furna Feia desponta como um dos principais. Localizado entre os municípios de Mossoró e Baraúna, o parque é a primeira unidade de conservação federal do Rio Grande do Norte e foi oficialmente aberto à visitação pública em junho de 2025, 13 anos após sua criação por decreto presidencial. Com uma área de aproximadamente 8,5 mil hectares, o parque abriga 218 cavernas catalogadas, formações rochosas únicas, espécies ameaçadas de extinção e sítios arqueológicos.
Para conhecer o parque, os turistas deverão preencher um formulário de agendamento e o acompanhamento de um condutor é obrigatório. Além de abrigar uma biodiversidade rica da Caatinga, o parque oferece experiências imersivas, como trilhas interpretativas, observação de fauna e vivências com comunidades vizinhas, que produzem artesanato e alimentos de forma sustentável.
George destaca, entretanto, que ainda há desafios estruturais a serem superados, especialmente no acesso às regiões do Oeste potiguar, onde estão concentradas as principais cavernas do estado. “Nós temos dificuldades para esse roteiro das cavernas, das grutas, em função da localização deles. Eles estão muito distantes do acesso aéreo, que é Natal, já que o aeroporto de Mossoró não está em funcionamento. A iniciativa de colocar o aeroporto de Mossoró com mais tecnologia, com mais itens que possam trazer aviões de maior porte, muda completamente o panorama”, afirma.
Para isso, a qualificação profissional será um fator determinante para o sucesso da rota. Ele destaca que a Fecomércio deverá atuar na capacitação dos trabalhadores, de acordo com as demandas específicas de cada município, em parceria com o Senac.
Para além dos empreendedores, a nova rota reflete em novas oportunidades para guias de turismo. A vice-presidente do Sindicato dos Guias de Turismo do RN (Singtur-RN), Iacy Vasconcelos, ressalta que o segmento exige capacitação específica e estrutura adequada para garantir segurança e qualidade nos atendimentos. “Essa rota das cavernas abre novas possibilidades de trabalho para os guias, desde que ela esteja estruturada. O deslocamento para essas cavernas é acessível? Que tipo de dificuldade nós vamos encontrar? Tudo isso está dentro da estrutura para que os guias consigam trabalhar”, explica.
Segundo Iacy, o turismo de caverna “exige cuidados específicos e formação adequada”, incluindo o uso de equipamentos de segurança e conhecimento técnico sobre as formações geológicas. Para o Sindicato, a criação da rota pode consolidar um novo nicho de mercado dentro do turismo potiguar, mas depende da execução efetiva da lei e da estrutura necessária nos municípios.
A expectativa é de que, com a regulamentação e os investimentos previstos, o Rio Grande do Norte se torne referência em turismo de cavernas e grutas na região Nordeste, unindo ciência, natureza e inclusão social.