
Desde novembro de 2024, pacientes com doenças raras no Rio Grande do Norte estão sem atendimento genético na rede pública de saúde. A denúncia da Associação de Doenças Raras do Rio Grande do Norte (AMPSRN) e da Apoie Epilepsia alerta para os impactos da ausência desse serviço no diagnóstico e acompanhamento médico. Segundo o estudo da Demografia Médica em 2023, são registrados somente 407 especialistas em genética médica em todo o Brasil e, até a época, apenas um em toda a rede pública do RN.
De acordo com Andrea Motta, presidente da AMPSRN, o problema tem se agravado ao longo dos últimos meses, com relatos constantes de pacientes e familiares sem perspectiva de atendimento. “As mães me ligam quase todos os dias solicitando uma consulta para seus filhos e eu não estou conseguindo, porque não tem, não existe mais geneticista aqui no estado”, disse. Com essa falta, ela relata que famílias chegam a se dirigir a outros estados à procura de um especialista, mesmo sem perspectiva de atendimento.Play Video
O médico João Neri, que até novembro atendia no Centro de Reabilitação Infantil (CRI), conta à TRIBUNA DO NORTE que, ao retornar de um período de férias após três anos sem recesso, foi surpreendido com a duplicação dos atendimentos, o que tornou a carga de trabalho inviável, já que o diagnóstico deve ser feito cuidadosamente diante dos riscos. Sem acordo com a direção, ele optou por pedir exoneração, encerrando cerca de 15 anos de atuação na saúde pública do estado.
No começo deste ano, o geneticista afirma que foi procurado pela Secretaria de Estado da Saúde Pública do RN (Sesap) para um acordo que viabilizasse os atendimentos. Sem condições estruturais devidas oferecidas nas instalações do CRI e até mesmo com a falta de internet, o médico sugeriu que a retomada acontecesse no Núcleo de Atendimento Especializado (NAE), o que até então não foi aceito pela pasta. A situação do Centro, de acordo com ele, já fez profissionais de outras especialidades também pedirem exoneração.
Sem o médico disponível para atendimento na saúde pública, Lusia Saraiva, cofundadora do Apoie Epilepsia, explica que as famílias estão sofrendo pela dificuldade do diagnóstico, o que pode ser determinante para a vida. “Hoje você tem uma doença rara, você tem que passar em cerca de 10 médicos para poder conseguir chegar no diagnóstico e é o geneticista que ajuda nisso. Mesmo após o diagnóstico, quem tem a doença precisa de acompanhamento pelo menos uma vez no ano com esse médico”, relata.
Segundo o Ministério da Saúde, para a grande maioria das condições raras, os tratamentos acontecem para a manutenção da qualidade de vida através da redução de sinais em sintomas, sendo poucas as intervenções medicamentosas eficazes. Muitas dessas doenças raras são condições crônicas complexas, que requerem abordagem assistencial.
“Meu papel é estudar os casos. Quem tem noção de como estudar os casos, chegar a um diagnóstico, é o especialista da área. Sem um diagnóstico adequado para o caso, o quadro pode se agravar. A maioria dos casos genéticos existe o risco da recorrência. Então você pode destruir famílias por falta de uma orientação”, diz.
Procurada, a Secretaria de Estado da Saúde Pública disse, em nota, que está reorganizando o atendimento na área citada com o objetivo de ampliar o acesso da população ao único médico geneticista atualmente em atuação no estado inteiro. “Os atendimentos deixarão de ser apenas presenciais para serem também por meio do sistema Regula NAE (Núcleo de Apoio Especializado), abrangendo assim mais facilmente todo o estado com atendimentos virtuais”, cita a nota.
Já completando cinco meses sem essa solução, a presidente da AMPSRN reforça que essa medida deve ser urgente, considerando os grandes impactos que a falta do tratamento pode gerar, levando até mesmo à morte.
Tribuna do Norte